Cena de um crime na rua.Foto de Ricardo Silva |
Seis adolescentes são mortalmente alvejados na madrugada de um sábado para domingo em Icoaraci, distrito afastado cerca de 18 km do centro de Belém. O caso ganhou repercussão nacional em novembro de 2011 e inseriu instantaneamente a “Vila Sorriso” nos mapas e nas recentes estatísticas da onda de violência que assola o país. Uma chacina que revoltou a população e que se soma a tantos outros episódios de violência na capital e no interior do Estado do Pará desde que essa terra habitada por este povo aguerrido e caloroso é anunciada ao mundo pelos meios de comunicação de massa.
Os jornais estampam afagos diários ao público a respeito de crimes, acidentes e de assassinatos de toda espécie. Programas de rádio e TV vendem espaços de propagandas entre matérias alicerçados na exploração da violência e da desgraça alheia. Uma ora o apresentador fala com falso ar de revolta sobre um assassinato, uma perseguição policial, para logo em seguida apresentar um tom descontraído e anunciar as qualidades de um novo produto e retornar às manchetes de crimes, alguns mais repetitivos que outros, entremeados por alguns que soam mais inéditos.
O incômodo se tornou algo prosaico em nossos dias, sobretudo em Belém, a capital do Pará. O incômodo “é”, simplesmente. O excesso de incômodos do dia-a-dia nos ensinou a amortecer com o tempo o nosso choque; nos tornou curiosamente preparados para não nos desprepararmos jamais; para nunca sermos pegos de surpresa e não deixarmos que a surpresa seja mais do que um fenômeno previsível.
Um acidente de trânsito, um corpo ensanguentado no chão, um caso de estupro, um incêndio, o desabamento de um prédio de 400 andares no centro, um assalto numa van às nove da noite no qual durante um breve espaço de tempo, entre uma rua e outra, o assaltante ameaça os passageiros com um arma enferrujada em punho de que vai “causar terror”. E nenhum pio. O medo de sair às ruas; de ficar em casa, o sobressalto e o alívio de saber que dessa vez escapamos, são eventos que, somados, vem nos tornando cada vez mais indiferentes, emudecidos. E a realidade, nesses termos, (parece) nos torna mais atentos à própria realidade e à vida, sem mistificações.
Hoje, o que incomoda - a quem ainda se deixa incomodar - é a paradoxal indiferença da maioria das pessoas em relação ao que antes era incômodo. O incômodo nos vem sendo encarado cada vez mais como algo absolutamente normal. Sem grandes e traumáticos espantos. O chocar-se até existe, mas é um dado instantâneo. Logo passa. Sempre passa. E logo depois, como sempre, a tragicidade vem acompanhada dos comerciais, com seus produtos maravilhosos.
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